quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

"Dead or alive, you're coming with me!"



"Missão dada (mesmo no exterior) é missão cumprida." AdoroCinema


Remakes geralmente são vistos com maus olhos, ainda mais se estivermos falando de um clássico, cultuado e adorado por muitos. Robocop é um desses filmes, uma obra icônica do cinema com sua hiper-violência, humor negro e sátira social. Bom, eu nunca o assisti (só assisti uma de suas sequências, que eu não lembro qual), então não posso dizer se é melhor ou não do que o remake de Padilha. Mas falando dessa nova versão isoladamente, digo que é um filme ótimo - e que não merece críticas tão injustas.

Vamos analisar os maiores detratores dele - os críticos americanos e os fã xiitas. No RottenTomatoes o filme está oscilando entre 49 e 50%. Aí você para e se pergunta: "meu Deus, por quê?". E a resposta é simples: eles não se cansam de ficar comparando o novo com o original de 1987. "Ah, não é tão violento por causa da classificação PG-13""Ah, o uniforme é preto e não cinza""Ah, ele não tem uma mão verdadeira""Ah, ele é MAIS ÁGIL do que o antigo Robocop".

Fãs xiitas, vão se lascar, ok?

A verdade é que o maior dilema de um remake está entre encontrar o equilíbrio entre não ser uma fotocópia do original e não ser uma versão nada a ver. E o Robocop de Padilha consegue isso. Adaptado a uma nova realidade, com novas temáticas e personagens (afora o protagonista, nenhum outro existe - nem mesmo com o mesmo nome - no original do holandês Paul Vernhoeven), ele é sim um filme diferente - mas as citações, elementos e singelas homenagens (como a quote que dá título a esse texto) podem sim agradar a muita gente que prefere o antigo.

E por mais que esta nova versão seja adaptada às massas como um legítimo blockbuster, possui o mérito de ser ousada, inteligente e crítica- tudo de uma forma sutil, é claro. O roteiro, assinado por Joshua Zetmer e com contribuições de Padilha, além de tratar em primeiro plano a relação homem/máquina, trás ainda ótimas críticas à política imperialista e hipócrita norte-americana, bem como a manipulação da mídia. 

Isso é evidente na sensacional abertura do filme, onde somos apresentados a Pat Novak (um Samuel L. Jackson inspirado como nunca), um apresentador direitista e que é a favor do uso das máquinas em solo americano, já que os EUA são o único país do mundo que proíbe a atuação militar delas. O que é irônico, porque o país é mostrado usando em Teerã para promover a "paz", mas o que se vê é imposição da ideologia yankee e subjugação de um outro povo, o que leva a um ataque suicida de homens-bombas iranianos que é rapidamente cortada da transmissão do programa de Novak, mostrando como ele é apto a manipular os fatos em favor do que defende. Aliás, muitos apontaram e eu retifico: Novak me lembra Datena, Marcelo Santana e muito desses apresentadores brasileiros que vemos nesses programas "verte-sangue" por aí, como Cidade Alerta, Balanço Geral e outros. Programas esses que me dão nojo, e que utilizam estratégias similares às mostradas no filme. Seria Padilha mandando uma indireta? Pode ser, mas ao que parece esse tipo de apresentador não é restrito ao nosso país. E mesmo se tratando de um filme passado em 2028, ele mostra um futuro bastante real e plausível, que encontra ecos nos presentes dias, onde vemos o EUA chutando as portas das casas árabes e de tantas outras nações para enfiar a sua "democracia" e "American Way of Life".

A outra temática do filme, a dicotomia homem-máquina, é tratada com bastante ênfase ao longo da produção. Vemos um Alex Murphy (um Joel Kinnaman que, apesar de ser um ator desconhecido, me agradou e convenceu bastante no papel principal) que é cada vez reduzido a uma máquina sem sentimentos, apenas para ser o produto perfeito da corporação OmniCorp (não se esqueça de notar o fato da fábrica da corporação estar localizada na China, assim como as grandes empresas fazem hoje por razões de mão-de-obra barata). Entretanto ao longo do filme o inevitável acaba acontecendo: o lado humano prevalece, principalmente graças à família de Murphy, um elemento ausente no original. A própria temática desse conflito interno do protagonista é maior explorada do que no de Vernhoeven.

Se por um lado Kinnaman pode ser estranho ao espectador por se tratar de um ator pouco conhecido, o elenco coadjuvante não podia ser melhor. Além da atuação épica de Samuel L. Jackson, destaco o sempre talentoso Gary Oldman no papel do Dr. Norton, responsável por criar Robocop, e Michael Keaton com suas usuais canastrice e canalhice, criando o CEO da Omnicorp que é o mais perto que temos de um vilão no filme. 

Por que digo isso? Por que vi em outra resenha uma das (poucas) falhas do filme é não criar um vilão presente o suficiente. O Raymond Sellars de Keaton é um empresário ganancioso e astuto, disso não há dúvida, mas é tão estranhamente carismático (justamente por ser tão canastrão e canalha como só Keaton pode ser) que nem mesmo quando toma atitudes "vilanescas" no clímax do filme acaba convencendo muito. Temos os policiais corruptos e o criminoso Vallon que armam a explosão que fere Murphy gravemente, o desprezível Mattox interpretado por Jackie Earle Hearley e até os drones e demais robôs pertencentes à empresa, mas não diria que eles são os grandes antagonistas. Robocop enfrenta tantos inimigos que no fim das contas nenhum deles se destaca tanto assim, a não ser Sellars.

Tecnicamente, o filme é um primor. É bom ver que Padilha mantém sua câmera trêmula e frenética vista nos dois Tropa de Elite - um sinal de que ele conseguiu aproveitar do seu estilo mesmo tendo de se submeter às regras de Hollywood, ao ponto de trazer os companheiros brasileiros Daniel Rezende pra edição e Pedro Bronfman pra trilha sonora. Esta aliás se destaca por revisitar o tema de Basil Poleudoris do primeiro filme e por canções como "Fly me to the Moon" de Frank Sinatra e "If I Had Only a Heart" do Homem de Lata d'O Mágico de Oz - canções inseridas no devido contexto. Há uma boa dose de violência, mesmo que quase nenhum sangue por causa da classificação etária. Por outro lado, temos uma cena fascinante e perturbadora que é a que mostra o quão danificado ficou Alex e o que restou de seu corpo após a explosão.

Há algumas cenas em particular que me chamaram a atenção, além da abertura em Teerão exibida pelo programa de Novak: uma singela cena onde vemos um homem com braços mecânicos executar um solo de violão (que serve de introdução para a construção do conflito homem/máquina); a cena onde Robocop vê o filho pela primeira vez após a explosão, já transformado em máquina; e é claro, a cena do depósito, onde temos o policial enfrentado Mattox e seus robôs ao som de "Hocus Pocus" do Focus (que você pode ouvir lá em cima no vídeo). Como um fã de rock progressivo, fico emocionado.

Então é isso. Sei que a resenha ficou grande pra caramba, mas realmente eu gostei muito do filme e não há como negar que estou orgulhoso de ver Padilha entrando com o pé direito e muita ousadia em Hollywood. Os gringos podem dizer que estamos superestimando o filme por ser dirigido por um brasileiro, mas quer saber? Dane-se se eles acham isso. Ou os 50% do RottenTomatoes. Robocop é um dos melhores reboots dos últimos tempos, e mesmo que as bilheterias sejam modestas já é certeza de que temos uma nova franquia aí. E que mantenha o mesmo padrão de qualidade e crítica!

sábado, 15 de fevereiro de 2014

Scorcese wannabe.

É muito difícil eu dizer isso de um filme, mas desta vez é realmente preciso: "Trapaça" é superestimado. É inegável que David O. Russell é um ótimo diretor, assim como é louvável sua "renascença", mas seu mais recente filme não é apenas fraco se comparado com seus concorrentes na corrida de prêmios que culmina no Oscar, como também em relação aos anteriores do diretor, "O Vencedor" e "O Lado Bom da Vida".

Aliás, tanto "O Lado Bom..." quanto "Trapaça" tem o feito de terem sido indicados nas quatro categorias de indicação ao Oscar. Mas analisando agora, será realmente merecido? Afinal de contas, são filmes que funcionam melhor pelos conjuntos, não por uma atuação aqui ou acolá. No caso de "Trapaça", esse caso é ainda mais explícito. Bale faz uma boa atuação como Rosenfield, e é impossível não se impressionar com mais uma metamorfose física desse cara. Mas ser indicado ao prêmio de Melhor Ator? Acho que não. O mesmo vale pra Cooper e Adams (esta está mais linda do que nunca, é realmente o papel mais sexy de sua carreira): competentes, mas não excepcionais. Lawrence se destaca no seu papel de uma esposa bipolar e instável (além de linda como sempre), rendendo o maior número de risadas (escassas, aliás), mas definitivamente não é a estrela do show. Jeremy Renner, Louis C.K. e Robert DeNiro - numa participação especial - também têm destaque, mostrando como esse é um filme coletivo, onde o todo vale mais do que a soma de suas partes.

Se por um lado o elenco é o grande destaque do filme, por outro a história não empolga. O filme ora se arrasta, ora avança dignamente, mas à exceção de momentos particulares (como a cena do jantar com os mafiosos e o final, um plot twist digno) não é 100% envolvente. O maior mérito do roteiro é levar à máxima o preceito diversas vezes abordado aqui, "as pessoas veem o que querem ver", ao ponto do próprio espectador ser enganado pelos golpistas no final. Outro ponto positivo é a trilha sonora bastante jazzística de Danny Elfman, que também conta com diversos sucessos do fim dos anos 70.

Mas ainda assim, não há como notar que ao longo do filme Russell tá tentando emular um diretor em especial. Seja através da trilha sonora rica, da ambientação, dos costumes e diversos outros elementos nota-se diversas referências ao grande Martin Scorcese. O próprio personagem de DeNiro, um matador a serviço da máfia, evoca o tipo "chefão do crime" que o marcou em The Godfather pt. II e nos filmes de Scorcese. 

Como outros já apontaram por aí, "Trapaça" parece uma versão mais comportada, divertida e glamourosa dos filmes do consagrado diretor. Contudo, não deixa de ser inferior. Basta comparar com "The Wolf of Wall Street", também lançado esse ano. Tendo assistido ambos os filmes, posso afirmar com propriedade: "The Wolf" é infinitamente superior. Mesmo sendo consideravelmente mais longo, a sensação que tive foi a de que o tempo passou mais rápido o assistindo do que com "Trapaça". 

No fim, este é um filme que se resume a algumas poucas palavras: "hype", "superestimado" e "caricato". É sempre mais do que parece ser, e no entanto é menos do que foi destinado a ser. Em um ano de concorrentes fortes no Oscar, esta é uma obra que, embora não sem suas (muitas) qualidades, não deixa de passar a impressão de que poderia ter sido melhor e mais enxuta.

domingo, 2 de fevereiro de 2014

Interferência.

A questão, creio eu, é que não dá pra viver cada um "em seu quadrado". A partir do momento em que nós, enquanto seres sociais, passamos a viver em conjunto com outros indivíduos, exercemos influência sobre o nosso meio, em diferentes graus, é claro, através de nossas crenças, valores, opiniões, atitudes e muito mais. Podemos até esconder algumas de nossas características, mas de uma forma ou de outra temos um peso nesse sistema social. Você é o que você faz de sua vida.

Agora, porque eu tenho de acreditar ou aceitar que tudo nesse mundo se resume a extremos? Que só existe as opiniões A e B, nunca uma C? Eu já disse antes, eu sou a Suíça. Já afirmei várias vezes que tento encontrar os meios-termos para tudo. É assim que sou, pelo menos desde o ano passado. Não necessariamente isso implica que estarei sempre certo (ninguém nunca está), mas em um mundo onde a verdade é um conceito cada vez mais relativo em favor de "variáveis" que são no fundo meros pensamentos de conveniência, tento observar as coisas por um ângulo que me faça analisar os extremos.

Eu busco não ser um crente fanático e/ou legalista, mas daí a você achar que eu aceito passivamente tudo o que se passa no mundo já é um grande erro, meu amigo.

A fé cristã exige a ação. Jesus não disse "recebeis minha salvação e sentais confortavelmente em suas cadeiras", mas sim "ide e pregai o evangelho a toda criatura". Esta não é a fé para ser experimentada apenas entre quatro paredes meu amigo, longe do conhecimento do resto do mundo. É fé para ser vivida no falar, no agir, no olhar, no pensar, fé que nos inunda, que transborda e alcança os outros, que muda a vida de quem está ao nosso redor. Que resulta numa interferência gloriosa.

Nem preciso dizer que não é isso que estamos fazendo com ela.

Uma vez cristãos, devíamos PERMITIR o amor do Eterno em nós. Amor esse que nos levaria a amar sem distinção, a fazer o bem sem olhar a quem. Veja bem, não estou falando no amor eros, deste de um casal. É no sentido mais genuíno da palavra, é "colocar as necessidades do outros à frente das suas", como diria Olaf, o boneco de neve de Frozen. Mas não é isso que acontece. Pelo contrário, "amor cristão" se tornou uma referência irônica ao fanatismo, à intolerância. Porque é por isso que nós temos sido conhecidos hoje em dia. What a shame.

(Obs.: apenas ressaltando que "tolerância não significa aceitar o que se tolera", já disse Gandhi.)

Eu sempre fui desses que acredita e segue a máxima expressa na letra da canção "Seen and Not Heard" do Petra: "Actions speak a little louder than words" (Ações falam mais alto do que palavras). Ou seja, aquilo que você faz fala mais alto do que o que você fala. Mas será que minhas atitudes comprovam os meus valores, o meu ideal de buscar meios-termos, ser respeitoso com todos? Muitas vezes não, e mesmo essa consciência ainda não é suficiente para que eu mude em prol disso. 

É necessária essa mudança, não só a mim, mas a milhões de cristãos que estão MANCHANDO a imagem do evangelho dia após dia. Dedicando tantos esforços a um pecado específico quando ignoram - e pior ainda, vivem - tantos outros no seu cotidiano. Que balança é essa? Esta renegação ao Pai implica em trágicas consequências, mas nunca é tarde demais. Metanoia. Mudança de sentido.

Ora vem, Senhor Jesus. Porque o negócio tá feio.