quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Consciência.




Dizem que Deus escreve certo por linhas tortas. Eu nunca concordei muito com essa frase.

Mas Ele pode se valer de todo e qualquer momento para nos ensinar. E posso dizer que passei por isso hoje. Há situações que em sua essência podem aparentar ser banais, mas cujas consequências podem nos trazer necessárias - e dolorosas - verdades.

Hoje eu colei na prova de Física. É. "Nossa, logo você, Vinícius, que era um aluno tão exemplar e bem-quisto, uma referência, fazendo uma coisa dessas?". É, logo eu. Era isso ou tirar 0, porque não sabia nada. Mas no fim das contas não adiantou muito, porque o professor pegou minha cola e deve ter me dado um zero do mesmo jeito.

Não fiz nenhum alarde. E por que faria? Eu sabia que aquilo era errado no momento em que decidi fazê-lo, então ter sido pego e perder nessa prova - com todas as suas implicações, incluindo a chance agora praticamente nula de passar nela nesse semestre e atrasar ainda mais o curso - era o que eu realmente merecia. Paguei o preço, e aceitei-o. 

No caminho para casa fiquei matutando várias coisas. Se contaria para minha mãe ou não (no fim contei, e vi que era o melhor a se fazer), um pouco no impacto desse zero pro curso, em culpa, nessas coisas. Chegando em casa fui pro quarto. Hora do desabafo. Mas sinceramente não sabia muito o que dizer.

Felizmente as palavras vieram. Enfim ia compreendendo que havia chegado numa situação-limite da minha existência: aquele ato de colar, tão supérfluo e natural pra tantos alunos (mas que nunca o fora pra mim), era apenas um reflexo do tipo de pessoa que vinha me tornando: um péssimo aluno, um péssimo cidadão, um péssimo cristão. Vivendo de relativismos morais, de conveniência, de hipocrisia. Negligenciando a Palavra, negligenciando e contradizendo meus princípios. Sabia que não podia mais viver essa vida. Sabia que precisava mudar.

Fui para a Palavra, pedindo orientação do Espírito para me guiar a uma passagem que falasse ao meu coração. E a achei, lá em Tiago, não à toa meu livro favorito da Bíblia. foram duas, na verdade:

"Quem dentre vós é sábio e entendido? Mostre pelo seu bom trato as suas obras em mansidão de sabedoria.
Mas, se tendes amarga inveja, e sentimento faccioso em vosso coração, não vos glorieis, nem mintais contra a verdade.
Essa não é a sabedoria que vem do alto, mas é terrena, animal e diabólica.
Porque onde há inveja e espírito faccioso aí há perturbação e toda a obra perversa.
Mas a sabedoria que do alto vem é, primeiramente pura, depois pacífica, moderada, tratável, cheia de misericórdia e de bons frutos, sem parcialidade, e sem hipocrisia.
Ora, o fruto da justiça semeia-se na paz, para os que exercitam a paz." Tiago 3.13-18


"Portanto, submetam-se a Deus. Resistam ao diabo, e ele fugirá de vocês.
Aproximem-se de Deus, e ele se aproximará de vocês! Pecadores, limpem as mãos, e vocês, que têm a mente dividida, purifiquem o coração.
Entristeçam-se, lamentem e chorem. Troquem o riso por lamento e a alegria por tristeza.
Humilhem-se diante do Senhor, e ele os exaltará." Tiago 4:7-10


Lendo essas duas passagens, fui tomado pelas lágrimas. E por que não seria? Afinal de contas aquela era uma palavra rhema, ou seja, a Palavra de Deus revelada e aplicada pelo próprio Espírito Santo a mim naquele momento. Não foi por acaso que eu caí exatamente naqueles dois textos. Eles tinham algo a me dizer, e logo vi do que se tratava: sabia que se precisava pedir alguma coisa a Deus, era justamente a Sua sabedoria: eu necessito dela, todos nós necessitamos, justamente pelos seus atributos. 

Ah, mas nós somos tão donos de nós mesmos, não é? Certamente foi o que pensei na hora da prova. Achei que estava no controle da situação, mas veja no que deu. E é claro, não foi a primeira vez e infelizmente não será a última. Faz parte de nós, essa ilusão de que podemos ser senhores de nosso destino. Mas o que foi que disse uma vez em um dos meus textos aqui no blog? "Fazemos planos, e eles viram pó".

Quantas vezes fui um tolo. Movido por inveja, sentimentos tão contraditórios como o orgulho e a inferioridade. Quantos momentos de crise, de dúvida, de incerteza quanto ao futuro. De se olhar no espelho e parecer não se reconhecer mais. A criança que um dia fui se orgulharia do rapaz que sou? Talvez não. Mas quero viver de forma que este rapaz ao menos sinta orgulho do homem do amanhã. 

Para isso preciso ser Mais Nele. E então chegamos ao que Tiago fala no capítulo 4. Está muito claro o que é preciso fazer, a Quem preciso entregar meu futuro, minhas escolhas. O meu eu precisa morrer cada vez mais, o mal precisa ser expurgado do meu coração, este precisa ser limpo e consertado, e só assim terei o direito de portar o nome de Cristo em minha vida. Afinal de contas, como diz a letra da linda música do vídeo lá de cima, se tenho a Ele, tenho a verdade, "no 'assim diz o Senhor' e não no 'eu acho que'".

Que esse não seja um momento de quebrantamento isolado e passageiro, onde o velho Vinícius volte à tona e se esqueça daquilo que o Espírito obrou nele. Mas que seja uma mudança contínua e constante, que se faça refletir não só em mim, mas naqueles à minha volta. E que impere a vontade do Deus vivo, Aquele que me amou primeiro, e não a vontade deste ser tão falho. Que seja a voz Dele a falar em minha consciência e me torne assim uma pessoa melhor, vivendo desta Verdade que ilumina e alimenta dia após dia.

"Eu tive muitas coisas que guardei em minhas mãos, e as perdi; mas tudo o que eu guardei nas mãos de Deus, eu ainda possuo." Martin Luther King

sábado, 13 de dezembro de 2014

As memórias da Terra-Média.

Fico feliz de que antes de assistir A Batalha dos Cinco Exércitos pude finalmente ler O Hobbit e O Senhor dos Anéis, depois de muito tempo postergando. Quando terminei a leitura dos livros comentei aqui algumas das minhas impressões sobre eles, palavras insuficientes pra descrever a grandeza desta obra, a magnificência dela. 

Talvez justamente por ter lido os livros depois de assistir os filmes fui menos crítico quanto a estes, embora hoje veja claramente que mesmo com a adição de muitos e interessantes materiais a esta trilogia d'O Hobbit (Dol Goldur, os prenúncios da ascensão de Sauron vista em LoTR), nada justifica a divisão em três filmes senão a fome por dinheiro dos estúdios. Isso ficou meio evidente em A Desolação de Smaug, que mesmo sendo um ótimo filme sofreu claramente daquela síndrome de "filme do meio" de uma trilogia, claramente sem um começo e fim definidos (apesar de que jogar o que devia ter sido seu clímax pro terceiro filme como sua cena de abertura tenha rendido um prólogo fenomenal para este e um cliffhanger incrível pra DoS). E Uma Jornada Inesperada, por mais que (aparentemente) seja o mais adorado pelos mais Tolkenianos, ainda sofre do fardo de sua lentidão e da infantilidade mal-disfarçada (vamos lembrar que o Hobbit foi um livro escrito pra crianças).

A Batalha dos Cinco Exércitos não compensa os erros dos anteriores, nem eleva a trilogia ao patamar de LoTR, mas wow, é um filme incrível. Mais curto (beeeem mais curto) que qualquer um dos outros ambientados na Terra-Média, ele possui duas metades distintas, além do já citado prólogo onde Smaug derrama em fogo sua fúria sobre a Cidade do Lago: a primeira trabalha toda a tensão dos exércitos que convergem pra Montanha Solitária em busca tanto de abrigo depois da calamidade quanto do tesouro que agora é reapossado pelos anões. E aqui eu preciso destacar todo o brilhantismo de Richard Armitage como Thorin, cada vez mais embebido da ganância e do poder, sofrendo da "doença do dragão". O personagem cresce significativamente, constituindo-se como uma figura trágica, um rei que é "menos do que foi". Digam o que quiserem, isso é um tapa na cara de quem diz que o Tolkien cria personagens unidimensionais. Com diferentes lados em posição, o conflito parece iminente, mas esta ainda é uma obra maniqueísta: os orcs chegam em torno dos 70 minutos, e então anões, elfos e homens se unem contra eles, marcando assim a batalha que dá título ao filme e o começo da segunda metade.

É sim um conflito grandioso, apresentando diversos elementos - as lutas às portas de Erebor, o conflito dentro das muralhas de Valle, intercalados com a própria companhia dentro da Montanha, sob as ordens de um Thorin cada vez mais conflituoso consigo mesmo. Ainda assim é uma batalha que infelizmente não alcança as glórias das de Helm's Deep ou os Campos de Pellenor da trilogia anterior (com esta última ainda se configurando como a maior cena de batalha da história do cinema), mas satisfaz. Ironicamente, seu melhor momento é justamente no final, onde os exércitos são deixados em um segundo plano pra vermos quatro anões, dois elfos e um hobbit lutarem contra o profano Azog e seus generais. 

(Aliás, quanta apelação pro Legolas hein? Na cena em que ele sobe as pedras a galera do cinema aplaudiu haha)

É aqui onde o filme atinge seus maiores feitos emocionais, mas não entrarei em mais detalhes pra não dar spoilers. Só posso dizer que um certo arco "filler" dessa trilogia é muito bem-resolvido, mesmo que de forma tão trágica (já esperada da minha parte), e o filme por fim consegue nos emocionar, trazendo um fim de certa forma agridoce. Ao final, em seus últimos minutos, o espectador/leitor vai sendo tomado de uma sensação nostálgica, na medida em que a obra vai fazendo suas conexões com O Senhor dos Anéis - conexões essas sugeridas ao longo dos três filmes, mas mais enfatizadas aqui. A última cena é a ponte entre as duas trilogias, quase uma convocação para que enfim as assistamos em ordem, como deve ser feito.

Como um amigo meu disse, o maior erro de Jackson foi querer de fazer d'O Hobbit um outro Senhor dos Anéis. São obras muito diferentes em espírito e ambição, e eu não posso deixar de fazer algumas comparações com Star Wars (até mesmo em termos de recepção crítica e de bilheteria). Não execrarei o Hobbit como muitos leitores fizeram, mas creio que a ideia original de dois filmes realmente devia ter sido respeitada. Contudo, não posso deixar de notar que a trilogia ganhou com a adição de tantos detalhes, muitos provenientes de anotações de Tolkien e/ou do Silmarillion (livro este que ainda preciso ler), e aqui fica claro que Jackson tem sim um enorme carinho e dedicação ao universo de Tolkien. Devemos agradecê-lo por, mais de 15 anos atrás, ter tido a coragem de trazer às telonas uma saga que, mesmo moldando a fantasia moderna como a conhecemos, poderia ser considerada "infilmável". O resto dessa história todo mundo já sabe. Então, mesmo que o Hobbit seja uma saga menos memorável do que LoTR (pelo menos em termos de legado para o cinema), ainda merece ser assistida, desfrutada, e encontrou em A Batalha dos Cinco Exércitos um desfecho satisfatório, senão digno.


E assim estaremos sempre voltando às páginas de Tolkien e às obras de Jackson. Lá e de volta outra vez.