quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Em retrospecto.

Amanhã o blog faz um ano de existência.

Então, o correto seria escrever esse texto amanhã, correto? Sim, mas provavelmente isso não vai ser possível. Sábado meu notebook, após meses travando e desligando sozinho e me tirando a paciência, parou de ligar. Tive de mandá-lo pra assistência. Estou escrevendo esse texto de um lugar como a lan house que salvou a minha pele nos meus primeiros anos em Aracaju, com a diferença de que esta é de graça e fica na biblioteca da UFS. E eu poderia escrevê-lo amanhã, neste mesmo local? Não. Sexta-feira é o único dia em que não tenho horário livre das 13h às 15h. 

Como se vê, minha falta de sorte continua firme e forte.

Inicio de facto esse texto admitindo uma dura verdade: o blog perdeu um pouco de sua importância pra mim ao longo de 2014. Passei a recorrê-lo cada vez menos para minhas reflexões. Na sua descrição está escrito "o expurgo de um coração partido", mas ele já não está mais partido. Está curado, graças a Deus. Quando eu terminar esse texto vou editar a descrição. Espero nunca mais ter de colocá-la de novo.

É estranho pensar que eu negligenciei o blog este ano, quando tinha muito mais motivos para recorrer a ele. Faltam 4 meses pra 2014 acabar, mas já posso dizer que este foi o ano mais difícil da minha vida. Pra não dizer o pior.

É, continuo mal na universidade. O dinheiro continua apertado. Mais dificuldades surgem, umas provocadas por minha imaturidade e incompetência, outras que estão além de minha compreensão e do meu controle. A raiva, a mesquinhez, a falta de iniciativa, o estresse, a tristeza, a angústia, o desespero, essas coisas queimam dentro de mim e me dominam tantas vezes. A carne, essa maldita carne, muitas vezes me domina e cega. Sobressai-se ao Espírito e seus frutos.

Sinto falta dos amigos que fiz no primeiro semestre, os que tiveram competência para seguir em frente. Fiquei pra trás, e quantas vezes esse sentimento de inferioridade latejou em minha mente. Como se eu precisasse de mais motivos pra me sentir inferior ou diminuído. Outras amizades tiveram de ser reavaliadas. 

(E outras maravilhosas surgiram. Nem tudo são espinhos e minha vida)

Quantas vezes quis me confessar para alguém tudo o que estava passando ou sentindo, e no entanto travei, guardei em meu coração, corroendo-o. As coisas mais difíceis de serem ditas...

A dualidade do ser engenheiro e ser escritor. Tenho condições de avaliar se Engenharia Civil é realmente o curso que quero? Considerando o que (não) fiz, acho que ainda não. Mas o que pensar, quando você faz um teste vocacional (um confiável, porque convenhamos que esses testes vocacionais da internet às vezes são mais falsos do que notas de 3 reais) que te identifica como uma pessoa analítica com vocação pra História e Letras? Como se eu já não estivesse confuso o suficiente.

Paralelamente o livro começou a ganhar feedback. Não apenas dos meus leitores betas, mas de uma editora, a Chiado, que se mostrou plenamente interessada em publicá-lo. Da minha parte eu assinaria aquele contrato na hora em que o li, mas meus pais e tios - que me bancariam - decidiram que era melhor procurar mais editoras antes de chegar a uma resposta final. Tive de aceitar, mas não sem resignação. O livro vai ter de esperar. Eu vou ter de esperar.

Mas estou cansado. Cansado desse semestre, cansado dessa rotina, cansado desse controle quase paranoico sobre meus gastos, cansado de repetir os velhos erros e não ter iniciativa para mudá-los, de esperar por algum momento mágico onde esteja bem. Eu olho para os céus e clamo por socorro, mas tantas vezes só encontro silêncio. E tu, ó Pai, é o único para quem eu posso dirigir minha raiva, o meu desespero, o meu choro. 

Mas mesmo nos momentos mais sombrios ainda encontramos alguma luz. Ou ela é posta para nós, de uma maneira inesperada, e de repente nos revoluciona, vira nossas vidas de cabeça para baixo. E nos instiga a ser alguém melhor.

Disse muitas coisas, mas nem estas palavras seriam capaz de expressar tudo o que passei  e vivenciei, para o bem ou para o mal. Espero que o blog não seja apenas um local de confissão de um universitário dramático, mas sempre um espaço de análise das coisas do mundo, do Espírito, daquilo que habita dentro de mim e que vale a pena ser exposto. Por fim deixo um agradecimento àqueles que se dispõe a ler esses textos e assim conhecerem mais de mim ou do que e como penso. 

E que venham ainda mais anos d'As Coisas que Sei.

sábado, 23 de agosto de 2014

A Terra-Média e eu.

Ontem terminei de ler O Senhor dos Anéis. Duas semanas atrás, peguei os livros e O Hobbit emprestados com o Jefferson para finalmente ler, após anos e anos dizendo a mim mesmo que já devia ter feito isso há mais tempo.
Ontem eu os terminei. E se houve em mim quaisquer arrependimentos por não tê-los lidos antes, era ínfimo diante de toda a admiração e paixão que nutro por essa obra magnânima.
Admito que estava com receio. Receio de achar a linguagem de Tolkien enfadonha, me perder em suas longas descrições, receio de achar que não proporcionaria a experiência que milhões de pessoas tiveram ao longo desses mais de 70 anos de existência da saga da Terra-Média. Bem, convenhamos: algumas partes cansam. Os hobbits na floresta, Frodo e Sam viajando pra Mordor. Muitas e muitas viagens, e sendo eu um cara pragmático e mais voltado para uma leitura objetiva e direta, senti realmente um cansaço nessas partes. Além de que, pelo fato de estarmos falando de um livro só dividido em três volumes, em alguns momentos ele acaba por ser bastante anti-climático. Ou alguns aspectos da própria linguagem utilizada nas conversas e pensamentos. Ou o excesso de canções.
Mas felizmente, e tenho orgulho em dizer isso, nenhum desses supostos aspectos negativos diminuiu minha visão em relação à obra. Não, eu posso dizer com certeza: DEVOREI esses livros. Li O Hobbit e A Sociedade do Anel em cinco dias cada, e As Duas Torres e O Retorno do Rei em três dias cada. Nem todos os dias eram possíveis, por causa da rotina da universidade, das minhas obrigações, mas sempre que possível lá estava eu lendo alguma passagem. Cada ida e volta da UFS, sentado no ônibus (e se possível, até mesmo a pé), lá estava eu lendo. Naquela aula chata também (sim, confesso). Em casa. Em suma, em todos os espaços que me permitiam a leitura. Estava completamente imerso naquele mundo.
No entanto, não foi exatamente a história que me fez ver a amplitude e a complexidade da Terra-Média, mas sim os longos apêndices do Retorno do Rei, onde Tolkien mostra todo o seu cuidado com a história, os reinos, as raças, as eras, as línguas, os calendários, a escrita. Como um filólogo, ele realmente se preocupou em tratar das diferentes linguagens usadas pelos povos da saga, com tanto esmero que é impossível no fim das contas não acreditar que esse mundo existe. Nem que seja na mente e coração de cada leitor. A verossimilhança da Terra-Média e de seus personagens é incontestável.
E os personagens? Ah, são tantos para se amar, odiar, admirar, desprezar. Do Frodo heróico e "seu" Sam (não posso negar que vi ali muito mais do que amizade e lealdade, mas nada que mude minha visão de que no fim das contas é Sam o grande herói, dando a seu mestre a força e o incentivo necessários quando tudo parece estar perdido), a cumplicidade de Merry e Pippin e suas consequentes interações com os antigos Ents, Gondor e Rohan (ah, o Denethor trágico e o Théoden gentil... esses personagens me marcaram, especialmente o último e sua relação paternal com Merry), a beleza e o complexidade de personagens femininas como Éowin e Galadriel, a sabedoria e os mistérios de Gandalf, a pioneira amizade de Legolas e Gimli, a majestade de Aragorn, a arrogância e queda de Boromir, o caráter digno de Faramir, o asco que Gollum nos traz, as maquinações e traições de Saruman (culminando num dos finais mais agridoces que já li), o nosso amado e divertido Bilbo e os Treze Anões... essa galeria de personagens tão complexos, memoráveis até os nossos dias e que assim o serão por anos e anos.
Por fim, chego ao peso que LoTR tem sobre a literatura fantástica. Se você é fã do gênero mas ainda não os leu, te digo uma coisa: não, você NÃO TEM a obrigação de lê-los. Mas por favor, leia, e assim entenderá o legado, o que essa saga significa para o gênero, goste ou não. E se, mesmo que no nosso mundo estejamos cansados de dualismos e maniqueísmos, de "jornadas dos heróis", entenda que de forma alguma esses livros se resumem a isso. Tolkien criou um mundo que até hoje nos influencia, nos move, nos encanta, nos entristece, um mundo como jamais existiu outro igual e que ainda é a base de muitos. E se há aqueles que insistem nas comparações ASOIAF x LoTR, só digo duas coisas: ambas as sagas são reflexos de seus tempos. E ambas são atemporais à sua maneira.

"Não gosto de nada por aqui - disse Frodo, - pedra ou poço, água ou osso. Terra, ar e água, tudo parece amaldiçoado. Mas nessa direção vai nossa trilha.
-É, é isso mesmo - disse Sam. - E de modo algum estaríamos aqui se estivéssemos mais bem informados antes de partir. Mas suponho que seja sempre assim. Os feitos corajosos das velhas canções e histórias, Sr. Frodo: aventuras, como eu as costumava chamar. Costumava pensar que eram coisas à procura das quais as pessoas maravilhosas das histórias saiam, porque as queriam, porque eram excitantes e a vida era um pouco enfadonha, um tipo de esporte, como se poderia dizer. Mas não foi assim com as histórias que realmente importaram, ou aquelas que ficam na memória. As pessoas parecem ter sido simplesmente embarcadas nelas, geralmente seus caminhos apontavam naquela direção, como se diz. Mas acho que eles tiveram um monte de oportunidades, como nós, de dar as costas, apenas não o fizeram. E, se tivessem feito, não saberíamos, porque eles seriam esquecidos. Ouvimos sobre aqueles que simplesmente continuaram nem todos para chegar a um final feliz, veja bem; pelo menos não para chegar àquilo que as pessoas dentro de uma história, e não fora dela, chamam de final feliz. O senhor sabe, voltar para casa, descobrir que as coisas estão muito bem, embora não sejam exatamente iguais ao que eram como aconteceu com o velho Sr. Bilbo. Mas essas não são sempre as melhores histórias de se escutar, embora possam ser as melhores histórias para se embarcar nelas!(...)

Pois este mundo, o princípio de todas as coisas, foi o primeiro passo para a construção do gênero literário do qual sou mais adepto, tal qual o conhecemos. E por isso lhe sou eternamente grato, Tolkien.