sábado, 13 de dezembro de 2014

As memórias da Terra-Média.

Fico feliz de que antes de assistir A Batalha dos Cinco Exércitos pude finalmente ler O Hobbit e O Senhor dos Anéis, depois de muito tempo postergando. Quando terminei a leitura dos livros comentei aqui algumas das minhas impressões sobre eles, palavras insuficientes pra descrever a grandeza desta obra, a magnificência dela. 

Talvez justamente por ter lido os livros depois de assistir os filmes fui menos crítico quanto a estes, embora hoje veja claramente que mesmo com a adição de muitos e interessantes materiais a esta trilogia d'O Hobbit (Dol Goldur, os prenúncios da ascensão de Sauron vista em LoTR), nada justifica a divisão em três filmes senão a fome por dinheiro dos estúdios. Isso ficou meio evidente em A Desolação de Smaug, que mesmo sendo um ótimo filme sofreu claramente daquela síndrome de "filme do meio" de uma trilogia, claramente sem um começo e fim definidos (apesar de que jogar o que devia ter sido seu clímax pro terceiro filme como sua cena de abertura tenha rendido um prólogo fenomenal para este e um cliffhanger incrível pra DoS). E Uma Jornada Inesperada, por mais que (aparentemente) seja o mais adorado pelos mais Tolkenianos, ainda sofre do fardo de sua lentidão e da infantilidade mal-disfarçada (vamos lembrar que o Hobbit foi um livro escrito pra crianças).

A Batalha dos Cinco Exércitos não compensa os erros dos anteriores, nem eleva a trilogia ao patamar de LoTR, mas wow, é um filme incrível. Mais curto (beeeem mais curto) que qualquer um dos outros ambientados na Terra-Média, ele possui duas metades distintas, além do já citado prólogo onde Smaug derrama em fogo sua fúria sobre a Cidade do Lago: a primeira trabalha toda a tensão dos exércitos que convergem pra Montanha Solitária em busca tanto de abrigo depois da calamidade quanto do tesouro que agora é reapossado pelos anões. E aqui eu preciso destacar todo o brilhantismo de Richard Armitage como Thorin, cada vez mais embebido da ganância e do poder, sofrendo da "doença do dragão". O personagem cresce significativamente, constituindo-se como uma figura trágica, um rei que é "menos do que foi". Digam o que quiserem, isso é um tapa na cara de quem diz que o Tolkien cria personagens unidimensionais. Com diferentes lados em posição, o conflito parece iminente, mas esta ainda é uma obra maniqueísta: os orcs chegam em torno dos 70 minutos, e então anões, elfos e homens se unem contra eles, marcando assim a batalha que dá título ao filme e o começo da segunda metade.

É sim um conflito grandioso, apresentando diversos elementos - as lutas às portas de Erebor, o conflito dentro das muralhas de Valle, intercalados com a própria companhia dentro da Montanha, sob as ordens de um Thorin cada vez mais conflituoso consigo mesmo. Ainda assim é uma batalha que infelizmente não alcança as glórias das de Helm's Deep ou os Campos de Pellenor da trilogia anterior (com esta última ainda se configurando como a maior cena de batalha da história do cinema), mas satisfaz. Ironicamente, seu melhor momento é justamente no final, onde os exércitos são deixados em um segundo plano pra vermos quatro anões, dois elfos e um hobbit lutarem contra o profano Azog e seus generais. 

(Aliás, quanta apelação pro Legolas hein? Na cena em que ele sobe as pedras a galera do cinema aplaudiu haha)

É aqui onde o filme atinge seus maiores feitos emocionais, mas não entrarei em mais detalhes pra não dar spoilers. Só posso dizer que um certo arco "filler" dessa trilogia é muito bem-resolvido, mesmo que de forma tão trágica (já esperada da minha parte), e o filme por fim consegue nos emocionar, trazendo um fim de certa forma agridoce. Ao final, em seus últimos minutos, o espectador/leitor vai sendo tomado de uma sensação nostálgica, na medida em que a obra vai fazendo suas conexões com O Senhor dos Anéis - conexões essas sugeridas ao longo dos três filmes, mas mais enfatizadas aqui. A última cena é a ponte entre as duas trilogias, quase uma convocação para que enfim as assistamos em ordem, como deve ser feito.

Como um amigo meu disse, o maior erro de Jackson foi querer de fazer d'O Hobbit um outro Senhor dos Anéis. São obras muito diferentes em espírito e ambição, e eu não posso deixar de fazer algumas comparações com Star Wars (até mesmo em termos de recepção crítica e de bilheteria). Não execrarei o Hobbit como muitos leitores fizeram, mas creio que a ideia original de dois filmes realmente devia ter sido respeitada. Contudo, não posso deixar de notar que a trilogia ganhou com a adição de tantos detalhes, muitos provenientes de anotações de Tolkien e/ou do Silmarillion (livro este que ainda preciso ler), e aqui fica claro que Jackson tem sim um enorme carinho e dedicação ao universo de Tolkien. Devemos agradecê-lo por, mais de 15 anos atrás, ter tido a coragem de trazer às telonas uma saga que, mesmo moldando a fantasia moderna como a conhecemos, poderia ser considerada "infilmável". O resto dessa história todo mundo já sabe. Então, mesmo que o Hobbit seja uma saga menos memorável do que LoTR (pelo menos em termos de legado para o cinema), ainda merece ser assistida, desfrutada, e encontrou em A Batalha dos Cinco Exércitos um desfecho satisfatório, senão digno.


E assim estaremos sempre voltando às páginas de Tolkien e às obras de Jackson. Lá e de volta outra vez.

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