sábado, 21 de junho de 2014

Ele se sentia como se não pertencesse a esse mundo.


"Eu descobri em mim mesmo desejos para os quais nada nesta Terra pode satisfazer. A única explicação lógica é que eu fui feito para outro mundo." C.S. Lewis


Ele se sentia como se não pertencesse a esse mundo. Como se fosse uma peça que não se encaixasse neste complexo quebra-cabeça social. Não se sentia disposto a atender certas convenções sociais, a trair sua individualidade em prol de aceitação dos outros. Quando tentava, falhava. Era maior do que ele.

Quando lhe ofereciam uma bebida, ele gentilmente recusava. Quando o chamavam para sair, muitas vezes simplesmente não tinha saco pra isso, mesmo que fosse com seus melhores amigos. Principalmente se sabia que iriam sair pra encher a cara. O que ganhava com isso, se beber nunca fora do seu feitio, por diversos motivos - não apenas o religioso, como muitos pensavam? 

Outros brincavam e zoavam com ele por ser bv. Diziam que iam arrumar uma garota pra perder logo esse bv. Inadmissível, inconcebível um cara com 18 anos nunca ter beijado alguém na boca na vida! Outros amigos, mais extremos, até brincavam dizendo que o levariam num puteiro. Ele era todo sorrisos, rindo dessas brincadeiras, dessas zombarias, dessas piadas. Mas no fundo sentia-se nervoso, incapaz de imaginar como reagiria se o pressionassem a tal. Daria para trás e seria ridicularizado por arregar na hora? Ou agiria como queriam que agissem, pegando a garota pra alegria da galera? Por isso evitava sutilmente. Contava com a auto-depreciação para abordar tal tema, buscando fazer com que o respeitassem por isso, com que não o forçassem a nada.

Às vezes era a carne que falava mais alto. Não precisava da pressão dos amigos; o desejo vinha por si só, o pensamento de como seria sua vida se não tivesse perdido aquele maldito bv logo. A carne mortificava a santidade, era alimentada no lugar desta. Brincadeiras aqui e ali mostravam alguém que parecia disposto a deixar sua espiritualidade de lado por um momento efêmero. Mas o juízo voltava, não apenas sobre isso mas sobre várias coisas. Pelo amor ou pela dor ele recobrava a razão. Lembrava-se das palavras, dos valores que lhe foram ensinados. Da sua singularidade. Lembrava-se de Quem tinha de seguir, Quem devia ser o seu modelo de comportamento. "Devo focar Nele", pensava. "O resto é consequência e eu não devo nada a esse mundo".

Ele não era perfeito; ninguém o é. É só que sua hipocrisia era mais escancarada em alguns momentos do que em outros. O que às vezes era supostamente uma ideia progressista que adotava na verdade era apenas uma máscara para se justificar, para justificar pensamentos que sabia serem incorretos. Ele não mentia para si mesmo; e justamente por conhecer a verdade de seus atos e seu interior tantas vezes deturpado era que o sentimento de culpa e remorso era tão intensificados. Algumas vezes eles não precisavam voltar porque ele não voltava aos mesmos erros. Outras vezes...

Ele também não era fixo a uma panelinha. Descobriu que podia ser amigos de várias pessoas, todas tão diferentes entre si. Mas nunca se sentia inteiramente parte de um grupinho. Às vezes faziam planos que não o incluíam (ou ele se excluía). Alguns dos grupos com os quais andava eram de pessoas com os mesmos perfis, mas ele não sentia como se compartilhasse dos mesmos perfis que elas. E por mais forte que fosse a amizade deles, sempre sentia que essas diferenças pesavam em vários momentos.

Ele sabia que nem tudo em sua vida significava escolher um meio-termo. Nem tudo podia se resumir a neutralidade. Ele não era rancoroso, mas guardava muitas coisas - muitas inúteis. Pensava mais do que agia, e sua mente criava um monte de situações, muitas totalmente nonsense (era dos que criavam diálogos em sua cabeça). Também observava bastante, juntando as pistas de certos assuntos aqui e ali. As pessoas podiam zoá-lo pelas costas. Mas ele saberia. Infelizmente só saberia e provavelmente nunca teria a coragem de ir além disso.

Mas mais do que tudo, ele temia por sua (e)terna contraditariedade. Em muitos casos ele sabia que aquele era apenas um termo bonito para hipocrisia mesmo. Também se achava superestimado por muitos, reflexo de uma auto-estima baixa e um temperamento melancólico. De certas pessoas queria mais atenção. Ao mesmo tempo por diversos momentos queria fugir do mundo, imergir em sua solidão que às vezes era tão amigável e calorosa. Ela não o fazia mal, não como as palavras de outros (e principalmente, de si mesmo) o faziam. 

Ele sabia que não era o mesmo de quatro ou cinco anos atrás, mas ao passo em que alguns aspectos mudara para melhor, também sabia que em outros essas mudanças tinham sido negativas. Sentia que às vezes andava em gelo fino, os valores seus contra os valores - ou a falta de valores - dos outros. Moralidade contra amoralidade e contra moralismo. Às vezes, ele contra o mundo. Outras, ele lado a lado com o mundo. E assim ia, sabendo que seu maior inimigo era a si mesmo. E que seu maior amigo residia no alto.

No fim das contas, ele sabia que sua vida era mais do que sua auto-estima ou seus relacionamentos ditavam. E que todo esse sentimento de "desfuncionalidade" era reflexo de uma verdade óbvia: 

Seu mundo nunca fora este. 

6 comentários:

  1. Cara, cada vez mais eu me impressiono como as coisas que você escreve aqui me tocam. Geralmente, me identifico quase que por completo, provavelmente, por motivos diferentes, mas no fim, vejo que mesmo tendo motivos diferentes, você consegue descrever com perfeição como eu me sinto na maioria das vezes.
    Cada palavra que escreveu me fez sentir uma pontada no coração, é exatamente muito do que sinto.
    Nunca senti como se pertencesse a este mundo, e por isso sou excluída e me excluo, sei das coisas e nada faço por não querer confrontar ninguém, etc.

    Você consegue descrever melhor os meus sentimentos do que eu mesma.

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    1. Me sinto extremamente honrado e feliz por isso Taina. Você não faz ideia.

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  2. E eu me sinto cada vez mais honrada de caminhar contigo, de ensinar e aprender na convivência e perceber nas diversas situações a qualidade do seu caráter e as escolhas que vc tem feito todos os dias. Independente dos altos e baixos (todos nós passamos por eles), como é bom "escolher Cristo todos os dias - Tales", mesmo sabendo que tem dias que não O escolhemos, mesmo assim somos alvo da misericórdia e do amor do Pai. Te amo filho.

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  3. Vinicius gostei muito do seu texto ( como sempre)...e também me sinto assim como vc. Sou muitas vezes conhecida como a "do contra", mas sabe mesmo que às vezes acabamos sendo pessoas que não somos , só para agradar certas pessoas, esquecemos de quem realmente temos que agradar, quem realmente nos ama do jeito que somos, mesmo com tantos erros, e com tantas dúvidas em nossos corações, Deus nos ama do jeitinho que somos e mesmo com os aflitos que passamos podemos entregar tudo nas mãos dele. Leia Mateus 6: 25-34 e Mateus 7:7-8; acho que vc vai entender o porque desses textos ^^
    Abraços *_*

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    1. Obrigado pelas referências Sara, estarei lendo e obrigado por suas palavras ^^

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